Rochas e minerais que só existem na ficção

Texto de Andrea Sander e Ana Lúcia Coelho, revisado por Irinea Barbosa, publicado em setembro de 2021.

Os minerais e rochas habitam o imaginário humano desde sempre, e sejam eles reais ou fictícios, carregam significados criados pelos homens, como o diamante nos anéis de noivado, simbolizando o amor eterno; ou o ouro nas joias reais, representando o poder e a nobreza.

A ficção também é rica em criar rochas e minerais que não existem na natureza nem foram artificialmente sintetizados pelo homem. Esses materiais, normalmente têm superpoderes e ajudam os personagens a vencer imensos desafios ou são extremamente úteis para a humanidade, com frequência tem protagonismo nas histórias das quais participam. Segue uma seleção dos materiais geológicos imaginários, porque ciência também é criatividade.

Os fãs de Harry Potter (ROWLING, 1997) e de alquimia conhecem a pedra filosofal, esta rocha tem o poder de transformar qualquer metal em ouro. Com a pedra filosofal também é possível fabricar o Elixir da Longa Vida, que permite prolongar a vida indefinidamente, além de curar doenças.

A pedra filosofal não é uma criação de Rowling para a série de livros de Harry Potter. Referências a essa substância estão presentes em textos medievais (século XIV), expondo que ela seria uma combinação de quatro elementos: fogo, terra, água e ar. Conforme a descrição, a pedra filosofal seria cristalina, semelhante ao vidro, ocorrendo em duas cores. Uma de cor branca, capaz de transmutar metais em prata, e outra vermelha, para transmutar os metais em ouro. Segundo as descrições medievais, a pedra filosofal é mais pesada que o ouro, é solúvel em qualquer líquido e não pode ser consumida pelo fogo.

Pedra Filosofal do filme Harry Potter e a Pedra Filosofal. Fonte: Barbosa (2020)

Já os fãs de Senhor dos Anéis (Lord of the Rings de J. R. R. Tolkien, 1954) conhecem o mithril, que é um metal prateado muito leve e extremamente forte, mais resistente que o aço, mais leve que o alumínio e que nunca se oxida, com aspecto semelhante à prata. Esse poderoso metal, na história de Tolkien, é usado pelos anões para fabricar roupas de proteção, já que as cotas não podem ser perfuradas por espadas, protegendo quem as usa. Além disso, conforme o livro A Sociedade do Anel, esse metal pode ser moldado como o cobre e polido como o vidro. Por estas características incomuns e por sua raridade, o material é muito valioso. Segundo o mago Gandalf (TOLKIEN, 954),“o mithril vale dez vezes seu peso em ouro”.

Para Tolkien, o mithril, também chamado de Prata dos Anões, é encontrado apenas nas minas de Moria, sob as Montanhas da Névoa, sendo extraído e trabalhado pelos anões ou pelo elfos. Ainda segundo o autor, o nome mithril vem de duas palavras da língua sindarin (criada pelo próprio Tolkien): mith que significa cinza; e ril que significa brilho.

Cota de mithril usado por Frodo no filme Senhor dos Anéis – A Sociedade do Anel Fonte: https://www.pinterest.nz/pin/12807180171221894/

Curiosidade: Como a ciência e a ficção servem mutuamente de inspiração uma à outra, desde 2003, o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) desenvolve o Projeto MIThril, uma plataforma de pesquisa do MIT Media Lab que busca desenvolvimento e prototipagem de técnicas de interação humano-computador, com a criação de “equipamentos vestíveis” para aplicações no corpo, tecnicamente denominados de “computação vestível com reconhecimento de contexto”. Quer saber mais? Visite o site do projeto: https://www.media.mit.edu/wearables/mithril/

No filme Avatar (CAMERON, 2009), superprodução com espetaculares efeitos visuais e tecnologia 3D, a história gira em torno do minério unobtainium, que é a solução para a crise energética no mundo, porém sua mineração está destruindo uma das luas do Planeta Pandora, levando a uma rebelião dos nativos, os Na'vi, contra os humanos. Pandora é um planeta distante, a 4,4 anos-luz da Terra, onde ocorre o unobtainium, minério supercondutor em temperatura ambiente, adquirindo, assim, propriedades diamagnéticas essenciais. Os materiais diamagnéticos são aqueles que, quando expostos a um campo magnético externo, estabelecem em seus átomos um campo magnético em sentido contrário ao que foi submetido, mas que desaparece assim que o campo externo é removido. No filme, essa propriedade surpreendente permite que as montanhas, que compõem uma formação rochosa denominada de Montanhas Aleluia, flutuem no ar.

No mundo real e no Planeta Terra, a supercondutividade só ocorre em temperaturas extremas: ou muito altas, cerca de 196ºC; ou muito baixas, o recorde de supercondutividade se deu a -135ºC, com um composto formado por mercúrio, tálio, bário, cálcio, cobre e oxigênio (AZEHEB, s.d.).

Como no caso da pedra filosofal, o termo unobtainium também não foi criado pelos autores de Avatar. De acordo com Hansen (1987), a palavra unobtainium vem sendo usada desde 1950 pelos engenheiros aeroespaciais da NASA, ao se referirem a materiais incomuns ou caros; ou para designar um material teoricamente perfeito para suas necessidades em todos os aspectos, só que ele não existe. Na década de 1990, o termo passou a ser usado em documentos formais de engenharia aeroespacial.

A palavra unobtainium deriva humoristicamente de inalcançável (unobtainable) com o sufixo ium, que é a designação convencional para elementos químicos, uma tradução possível em português seria inalcançavium.

Fragmento de unobtainium. Fonte: https://whatculture.com/film/10-things-you-didnt-know-about-avatar?page=4

Curiosidade: Mas o que é um ano-luz? O ano-luz é uma medida de comprimento utilizada na Astronomia, que corresponde à distância percorrida pela luz (um fóton) em um ano. Equivale, aproximadamente, a 9,5 trilhões de quilômetros e precisamente 9.460.536.207.068.016 de metros percorridos a uma velocidade de 299.792.458 metros por segundo, durante 365 dias.
Quer calcular a distância entre a Terra e Pandora? É fácil! Basta multiplicar a velocidade da luz pelo número de segundos que existe num ano. Lembrando que um ano tem 31.536.000 de segundos, então é multiplicar este número pelos 4,4 anos-luz: 300.000 km X 31.536.000 s= 9.460.800.000.000 km
9.460.800.000.000 km X 4,4 = 41.627.520.000.000 km ou quarenta e um trilhões, seiscentos e vinte e sete bilhões, quinhentos e vinte milhões de quilômetros.

Falando na velocidade da luz, a nave espacial Enterprise, da mítica série Jornada nas Estrelas (Star Treck de G. Roddenberry, 1966), viaja na velocidade da luz graças ao dilithium, mineral que ao ser submetido a campos magnéticos de alta frequência produz energia necessária para as naves ultrapassarem grandes velocidades e, assim, cobrirem as imensas distâncias da Galáxia. Muitos episódios da série abordam esse mineral, sua mineração, os danos causados por ela e a exaustão deste bem mineral na Galáxia.

No universo de Jornada nas Estrelas o material inventado dilithium é o agente de controle na velocidade de dobra mais rápida do que a luz, sendo um mineral muito raro, com número atômico 87, que na realidade pertence ao Frâncio, com símbolo químico Dt, membro da série fictícia de Elementos Hipersônicos, de acordo com a tabela periódica vista em episódios de Star Trek: The Next Generation. É descrito como um mineral cristalino, extremamente duro, que ocorre naturalmente em alguns planetas. Acredita-se que este material exista em mais de três dimensões ao mesmo tempo e isso está de alguma forma relacionado às suas propriedades. O dilithium também está descrito no jogo Star Fleet Battles: A New Beginning do MIT (LEISERSON JUNIOR, 2004).

O dilithium é definido por Fourestier (2005), no manual The Mineralogy of Star Trek, como um mineral cristalino, raro e incalculavelmente valioso, usado como o elemento primário nos reatores de matéria/antimatéria, necessários para viagens em velocidade de dobra. É extraído dos planetas Rigel XII, Rura Penthe, Dozaria, Troyius, Vaska, Coridan e Drema IV, nas minas Reman, em Remus (um planeta do sistema Romulan), e no Sistema Halkon.

Cristal de dilithium sendo carregado para a Enterprise. Fonte: Diluthium (s.d.).

Curiosidade: O mineral fictício dilithium tem cor rosa, que é a cor conferida pelo elemento lítio quando presente em minerais verdadeiros, por exemplo, o quartzo rosa pode conter impurezas de lítio e as micas de lítio, lepidolita e zinvaldita, também são rosadas. Neste caso, a ficção imitou, com precisão científica a realidade.

Os fãs da saga Guerra nas Estrelas (Star Wars de G. Lucas, 1977) também têm o seu material imaginário superpoderoso, é o phrik, uma substância resistente aos sabres de luz. Porém, o phrik não é um mineral, é uma liga metálica que combina os minérios fictícios de phrikite e de tydirium, resultando em uma substância maleável e praticamente indestrutível, que pode ser combinada com outros minérios, ligas e compostos. Esses minerais raros são obtidos pela mineração na décima sexta lua do gigante gasoso Gromas, no setor Perkell, chamada de Gromas 16, e no planeta Tatooine, no setor Arkanis. Entretanto, são minerais muito raros e caros, impedindo seu uso maciço em artefatos de guerra. O phrik é um composto tão durável que um recipiente dessa liga metálica foi capaz de permanecer intacto em Alderaan, quando o planeta foi destruído pela Estrela da Morte.

Trooper sombrio com armadura feitas de phrik. Fonte: https://www.pinterest.cl/pin/88523948914354196/

Além do phrik, há muitos outros minerais na saga Star Wars, mas os mais populares da franquia são o beskar e a carbonita.

O beskar é conhecido como ferro mandaloriano, mineral encontrado no planeta Mandalore e em sua lua, Concordia. O metal é durável e excepcionalmente forte, com a capacidade de resistir aos golpes dos sabres de luz. A resistência natural do beskar é ampliada pelo processo de forja, que usa técnicas secretas conhecidas apenas pelos ferreiros mandalorianos. É usado para fazer armaduras, armas (incluindo punhos de sabre de luz), escudos de mão e naves estelares.

Armaduras de beskar - Imagem de divulgação Disney. Fonte: Ribeiro (2020).

Curiosidade: Você sabe o que dá resistência ao aço? Basicamente, o aço é uma liga de ferro e carbono. Ambos são materiais encontrados em abundância na crosta terrestre. O carbono como carvão é um mineralóide de origem orgânica e o ferro, em geral, ocorre como óxido de ferro, em minerais como a hematita e a magnetita. Essas substâncias são misturadas, sendo que o carvão tem um duplo papel na fabricação do aço: como combustível, permitindo que alcancem altas temperaturas (cerca de 1.500º Celsius), necessárias à fusão do minério; provocando a redução do Fe, transformando o Fe2O3 (o minério de ferro) em ferro gusa líquido, com teor de ferro da ordem de 95 %.

A carbonita não é exatamente um mineral, é gás carbônico líquido solidificado por congelamento rápido, sendo utilizado para preservar bens e colocar as pessoas em um estado de hibernação, como Han Solo, em Star Wars Episódio VI: O Retorno de Jedi, em que ele foi aprisionado em carbonita por Darth Vader. Antes da invenção do hiperdrive, a carbonita era utilizada para manter as pessoas em vida suspensa em viagens longas pelo espaço, porém o descongelamento trazia vários efeitos colaterais.

Han Solo congelado em carbonita Fonte: https://www.flickr.com/photos/coffeego/11303453375

O mundo das HQs está repleto desses minerais poderosos. A Marvel usa diversos minerais imaginários em suas histórias, como osmium e o adamantium, presentes nas HQs dos X-Men; o uru usado na fabricação do martelo de Thor; e o vibranium usado na criação do escudo do Capitão América. No universo da Marvel, as grandes reservas de vibranium encontram-se no fictício país africano Wakanda, terra natal do Pantera Negra. A origem das reservas está ligada à queda de um meteorito. Já a DC Comics criou o amazonium, metal dos braceletes da Mulher-Maravilha ou a kryptonita, mineral capaz de enfraquecer o Super-Homem.

Garras de adamantium do X-Men Wolverine; escudo de vibranium do Capitão América e braceletes da Mulher-Maravilha.

Curiosidade: Assim como o fictício vibranium, na tumba do faraó egípcio Tutancâmon foi encontrada uma adaga que surpreendeu os pesquisadores, pois apesar de estar depositada há aproximadamente 3.300 anos, estava em perfeito estado, sem qualquer ferrugem. A análise do ferro utilizado na confecção da adaga revelou que continha 10% de níquel e 0,58% de cobalto, componentes essenciais do ferro encontrado em meteoritos, mostrando que a lâmina era feita de material extraterrestre. Aqui a ficção imitou a realidade! Leia mais em: https://www.researchgate.net/publication/303438775_The_meteoritic_origin_of_Tutankhamun's_iron_dagger_blade.

Do megassucesso Guerra dos Tronos (Game of Thrones de G. R. R. Martin, 1996) vem o aço valiriano, que não é um mineral, mas uma liga metálica criada em Valíria, com o qual se fabricam armamentos de qualidade incomparável, cuja forma de fabricação foi perdida no tempo.

De acordo com a mitologia da saga Game of Thrones, o aço valiriano, possivelmente, é forjado no fogo dos dragões e, também, é provável que haja magia envolvida na fabricação dessa liga. As lâminas construídas com aço valiriano apresentam padrões ondulados, semelhantes a impressões digitais, pois o aço é dobrado sobre si mesmo milhares de vezes. Essas espadas e adagas são mais leves, mais fortes e mais afiadas do que o melhor aço forjado pelos homens, e suas lâminas jamais perdem o fio ou enferrujam. São extremamente valiosas e é um dos poucos materiais capazes de matar os caminhantes brancos.

Espada de aço valiriano Veneno do Coração. Fonte: Gly (2016)

Mas no universo de Game of Thrones há um material que é real, é a pedra de dragão, ela existe de fato e se chama obsidiana. A obsidiana é o vidro vulcânico, um mineralóide, já que não possui retículo cristalino, pré-requisito para uma substância ser considerada um mineral. A obsidiana forma-se a partir do resfriamento rápido de lavas ricas em sílica. A obsidiana é usada na fabricação de lâminas de bisturi, pois seu fio pode ser até cinco vezes mais fino que o dos bisturis de aço. Os cortes feitos com as lâminas de obsidiana são muito finos e causam menos danos aos tecidos orgânicos, permitindo que as feridas cirúrgicas cicatrizem rapidamente.

Fragmento de obsidiana com sua típica coloração escura, brilho vítreo e fratura conchoidal. Fonte: https://orgonitespoa.com.br/produto/obsidiana-negra-10/

Curiosidade: O que é a obsidiana? É um mineraloide, pois não possui uma estrutura cristalina definida, característica necessária para classificar o material como um mineral. Tem cor escura, brilho vítreo típico e apresenta fratura conchoidal. Ela é encontrada em regiões de vulcanismo recente, como Austrália, Nova Zelândia, Turquia, México, Estados Unidos e Islândia. No Brasil, o local de maior ocorrência é no Rio Grande do Sul.

Referências

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