As Medalhas Olímpicas e Paralímpicas, o Meio Ambiente e as Geociências

Texto de Andrea Sander e Ana Lucia Coelho, revisão de Irinea Barbosa da Silva

As medalhas como prêmio para os campeões das diferentes modalidades esportivas surgiram na primeira edição dos Jogos Olímpicos da Era Moderna, em 1896. Nos jogos da Antiguidade, ocorridos em Atenas, na Grécia, no lugar de medalhas, os campeões recebiam uma coroa de ramos de oliveira (e não de louro, que eram usadas em Roma), quer eram colhidos de uma árvore sagrada dos jardins de Zeus, divindade máxima da Grécia Antiga. Essa oliveira teria sido plantada por Hércules, em comemoração ao sucesso de um de seus doze trabalhos. (SANTIAGO, 2021).

Ruínas da cidade de Olímpia (por isso Olimpíadas), onde se realizavam as competições na Antiguidade.

Na primeira edição dos Jogos Olímpicos da Era Moderna, foram distribuídas medalhas, de prata e bronze, para o primeiro e segundo colocados de cada modalidade olímpica. A medalha de ouro surgiu apenas quatro anos mais tarde, na Olimpíada de Saint Louis, nos Estados Unidos, em 1904.

Raras medalhas de ouro, prata e bronze da Olimpíada de Saint Louis, USA, 1904. Fonte: Axon (2016).

A partir das Olimpíadas em Estocolmo, ocorridas na Suécia, em 1912, as medalhas deixaram de ser feitas de metais puros, ouro, prata e bronze maciços, e passaram a ser confeccionadas com uma combinação de diferentes materiais. Na verdade, a medalha de ouro é feita de prata com um banho de seis miligramas de ouro; a de prata é totalmente de prata e a de bronze é feita de uma liga de 95% de cobre e 5% de zinco.

Medalhas de ouro prata e bronze das Olimpíadas de Estocolmo, Suécia, 1912. Fonte: Bronze...(2015)

Mas o que o meio ambiente tem a ver com isso?

Para fabricar as medalhas que estão sendo usadas na premiação dos Jogos Olímpicos de Tóquio, 2021, os japoneses coletaram mais de 78 toneladas de aparelhos eletrônicos descartados, como smartphones, tablets e computadores, de onde foram retirados os componentes que contêm ouro, prata e cobre, principal metal da liga de bronze. Os equipamentos foram recolhidos entre abril de 2017 e março de 2019 em mais de 18.000 locais espalhados pelo Japão (ROSSINI, 2019).

Resíduos eletroeletrônicos (REEE)

Dos resíduos eletroeletrônicos (REEE), foram reciclados 32 quilos de ouro, 3.500 quilos de prata e 2.200 quilos de cobre, metais em quantidade suficiente para fabricar as cerca de 5.000 medalhas necessárias para os Jogos Olímpicos de 2021! (ROSSINI, 2019).

Medalhas de prata, ouro e bronze usadas nas Olimpíadas de Tóquio, Japão, 2021. Fonte: Rossini (2019)

Esses metais, em particular o ouro, são largamente empregados na fabricação de circuitos de equipamentos eletroeletrônicos. Isto porque o ouro é um condutor altamente eficiente, que pode levar correntes muito baixas sem perda de energia, não sofre qualquer tipo de oxidação ou corrosão e é dúctil, podendo ser estirado em fios extremamente finos, propriedade importante na fabricação das placas de circuito impresso (PCI). Componentes eletroeletrônicos feitos com ouro são altamente confiáveis e, por isso, este metal é utilizado na fabricação de quase todas as placas de circuito impresso.

Placa de circuito impresso com os componentes metálicos sendo retirados. Fonte: Ouro...(2021)

Onde as geociências entram nessa história?

Os metais ouro, prata, cobre e zinco, sendo que os dois últimos, combinados em uma liga, formam o bronze, são originalmente extraídos de minas, isto é, são bens minerais. Como todos os minérios, são bens não renováveis, portanto são recursos finitos e não irão surgir na natureza, pelo menos não na escala de tempo da humanidade. Por este motivo, é muito importante que os minérios sejam recuperados através da reciclagem e possam ser reutilizados na fabricação de novos equipamentos, pois um dia eles poderão faltar. Os metais ouro, prata, cobre e zinco, sendo que os dois últimos, combinados em uma liga, formam o bronze, são originalmente extraídos de minas, isto é, são bens minerais. Como todos os minérios, são bens não renováveis, portanto são recursos finitos e não irão surgir na natureza, pelo menos não na escala de tempo da humanidade. Por este motivo, é muito importante que os minérios sejam recuperados através da reciclagem e possam ser reutilizados na fabricação de novos equipamentos, pois um dia eles poderão faltar.

É muito difícil prever a quantidade de ouro que ainda há no mundo para ser explorado, pois a pesquisa evolui, assim como as tecnologias, permitindo a melhor forma de retirar este minério das rochas e, principalmente, nos depósitos profundos. De acordo com o Serviço Geológico dos Estados Unidos, o estoque subterrâneo de reservas de ouro no mundo é estimado em cerca de 50 mil toneladas. Para colocar isso em perspectiva, há uma estimativa aproximada que cerca de 190 mil toneladas de ouro já foram mineradas no mundo (QUANTO..., 2020).

Na indústria, esse metal precioso é utilizado, principalmente, na fabricação de joias, 48% de todo ouro extraído no mundo tem esta finalidade; outros 40% são utilizados em operações financeiras e 12% é usado para fabricar equipamentos eletroeletrônicos. (NICOLETTI, 2013).

Com relação aos metais preciosos nos eletroeletrônicos, embora os números variem entre fabricantes e modelos, em uma tonelada de telefones celulares são encontrados de 250 a 300 gramas de ouro e até 3 quilos de prata. Também estão presentes quantidades consideráveis de paládio (20 g) e platina (menos de 1 g), além de alumínio e cobre (SILVA et al., 2020).

O interior de um smartphone

Para se ter uma ideia, uma das minas com teor mais baixo do mundo está localizada no Brasil, é a Mina Morro do Ouro, localizada em Paracatu, Minas Gerais. O teor médio da Mina Morro do Ouro é de apenas 0,43 grama de ouro por tonelada, e sua produção anual é de cerca de 6,7 toneladas de ouro e 1,3 toneladas de prata. Para isso, é necessário o processamento de 19,3 milhões toneladas de minério por ano (MIRANDA JÚNIOR, 2011).

Mina de ouro Morro do Ouro, liderada pela empresa canadense Kinross Gold Corporation, em Paracatu, Minas Gerais. Fonte: Google Earth (2021)

Comparando os celulares, que contêm de 250 a 300 gramas de ouro por tonelada e o teor da Mina Morro do Ouro, que é de 0,43 gramas de ouro por tonelada, observa-se que, a concentração de ouro nos celulares é quase 600 vezes maior do que na Mina Morro do Ouro, porém o processamento é de apenas uma tonelada de material, enquanto em Morro do Ouro são processados 19,3 milhões de toneladas de rochas!

É claro que em minas com teores maiores de ouro por tonelada a relação se modifica. Valores médios, em torno de 5 a 10 gramas de ouro por tonelada de material explorado, são mais comuns na mineração, mesmo assim os celulares ainda concentram de 50 a 10 vezes mais ouro que minas com teor médio de ouro.

Neste contexto, surge a mineração urbana, que substitui o minério extraído das jazidas pela extração de mentais preciosos, em particular ouro e prata, que vão parar no lixo depois que os equipamentos eletrônicos chegam ao fim de sua breve vida útil.

E você? Já pensou no seu celular como uma mina de alto teor de minerais? Cuide dele e do meio ambiente.

Referências

AXON, R. Rare golf medals from 1904 Olympics discovered. USA Today Sports [on line], 9 jun. 2016. Disponível em: https://www.usatoday.com/story/sports/olympics/rio-2016/2016/06/09/rare-golf-medals-1904-olympics-discovered/85659192/. Acesso em: 09 ago. 2021.

BRONZE medal from the 1912 Summer Olympics, Held in Stockholm, Sweden. Nate D. Sanders Auctions: fine autographs & memorabilia, Los Angeles, 25 jun. 2015. Disponível em: https://natedsanders.com/bronze_medal_from_the_1912_summer_olympics__held_i-lot37123.aspx. Acesso em: 09 ago. 2021.

GOOGLE EARTH. Imagem de localização da mina de ouro Morro do ouro em Paracatu, Minas Gerais. Disponível em: https://www.google.com.br/maps/place/Kinross+Paracatu/.Brasil: Google, [2021]. Acesso em: 10 ago 2021.

MIRANDA JÚNIOR, I. S. Diretrizes fundamentais para um estudo de avaliação econômica de empreendimentos de mineração: um estudo bibliográfico. 2011. 321 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mineral) – Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto, 2011. Disponível em: http://www.repositorio.ufop.br/handle/123456789/2648. Acesso em: 08 ago. 2021.

NICOLETTI, J. Matérias-primas encontradas no lixo eletrônico. Deutsche Welle [on line], 06 jul. 2013. 06.07. 2013. Disponível em: https://p.dw.com/p/192gp. Acesso em: 09 ago. 2021.

OURO reciclado: uma tendência mundial. Compro Ouro BH, Belo Horizonte, 22 mar. 2021. Disponível em: https://www.comproourobh.com.br/ouro-reciclado-uma-tendencia-mundial/. Acesso em: 09 ago. 2021.

QUANTO ouro ainda há para ser extraído no mundo (e quem tem as maiores reservas minerais). BB News Brasil [on line], São Paulo, 28 set. 2020. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-54303668. Acesso em: 09 ago. 2021.

ROSSINI, M. C. A medalhas das Olimpíadas 2020 serão feitas de material reciclável: e elas ainda serão bronze, prata e ouro, tudo coletado de aparelhos eletrônicos usados. Super Interessante [on line], São Paulo, 29 jul. 2019. Disponível em: https://super.abril.com.br/sociedade/as-medalhas-das-olimpiadas-de-2020-serao-feitas-de-material-reciclavel/. Acesso em: 09 ago. 2021.

SANTIAGO, E. Olimpíadas na Grécia Antiga. InfoEscola, Brasil, [2021]. Disponível em: https://www.infoescola.com/esportes/olimpiadas-na-grecia-antiga/. Acesso em: 09 ago. 2021.

SILVA, M.; OLIVEIRA, C.; FERREIRA, R.; CARDOSO, A. Risco ambiental e biotecnologia na recuperação de metais da placa de circuito impresso (PCI). Brazilian Applied Science Review, São José do Pinhais, PR, v. 4, n. 4, p. 2494-2505, 2020. DOI 10.34115/basrv4n4-026.Disponível em: https://www.brazilianjournals.com/index.php/BASR/article/view/13863. Acesso em: 09 ago. 2021.